Homenagem ao escultor senegalês, Ousmane Sow, o homem que celebrava, através das suas esculturas gigantes, autênticos titãs, a luta de povos insubmissos, desde a África às Américas. Nasceu há noventa anos e faleceu há quase dez, deixando um legado importante ao mundo, à África.
Dulce Araújo - Vatican News As obras de Ousmane Sow, para além de representar uma riqueza imensa para a África, onde foram expostas em vários países, deram a volta ao mundo. Mas, uma das suas célebres exposições foi na Pont des Arts, em Paris, onde foram visitadas, em dois meses e meio, por mais de três milhões de pessoas. A enorme dimensão das suas obras permitiu que todos os visitantes pudessem ver, sem empurrões, as faces dos esculpidos, ou seja, Nubas, Masais, Índios da América do Norte, exemplos de povos que lutaram pela defesa da sua terra, identidade e direitos, mesmo conscientes de que podiam não ter a última palavra. Fisioterapista de profissão, Ousmane Sow afirmava que isto lhe permitiu libertar-se do eventual complexo da perfeição do corpo humano - o que, a seu ver, terá afetado os gregos. Não só: Ousmane gostava de ver nas suas obras - inicialmente modeladas com uma substância resistente, cuja composição só ele conhecia - a marca dos seus dedos e a trama dos tecidos de juta que utilizava. Isto fez com que recusasse por longo tempo o uso do bronze que, considerava muito "frio", acabando, todavia, por encontrar também nesse material a sua marca autêntica. Visto como um Rodin (escultor e pintor francês, considerado o maior da sua época - 1840-1917), o intelectual, Filinto Elísio (Rosa de Porcelana Editora), afasta desta tentação, escrevendo na sua crónica que " Ousmane Sow era um artista singular e irrepetível." Leia aqui a crónica completa: Ousmane Sow – o recriador dos titãs Ousmane Sow nasceu em 10 de outubro de 1935 em Dacar, Senegal. Quando criança, esculpia figuras em blocos de calcário encontrados na praia. Após a morte de seu pai, Sow Senior, em 1956, deixou Dacar para estudar na França, onde licenciou-se em enfermagem e fisioterapia. Retornou ao Senegal após a independência, em 1960, e iniciou sua prática de fisioterapia. Posteriormente, retornou à França e exerceu essa profissão até aos cinquenta anos, quando a sua escultura começou a fazer sucesso. A sua formação como fisioterapeuta e o seu perfeito conhecimento de anatomia foram elementos marcantes das suas obras. No entanto, retornou definitivamente ao Senegal em 1978 e se dedicou integralmente à arte, especialmente à escultura de estátuas gigantescas de pessoas e grupos de pessoas. Assim, a partir de 1987, com sua primeira exposição organizada pelo Centro Cultural Francês de Dacar, ele se dedicaria inteiramente à sua arte. Exibiria os seus famosos lutadores Nuba, um povo do Sudão do Sul. Uma outra série de esculturas seguirá: “Masai”, em 1988; “Zulu”, em 1991 e “Peul”, em 1993, mas também “A Batalha de Little Big Horn”, uma série de onze cavalos e vinte e quatro personagens. Nos anos 2000, criaria também mais de oitenta personagens em bronze, um autêntico recriador de titãs. Sow realizou inúmeras exposições internacionais, incluindo a Documenta IX em Kassel (na Alemanha), em 1992, n o Palazzo Grassi, em Veneza (Itália), durante a Bienal de 1995, e a Pont des Arts, em Paris, em 1999. No Prémio Príncipe Claus de 2008, com o tema Cultura e Corpo Humano, ele foi um dos onze laureados. O prémio foi concedido pelas suas impressionantes esculturas do corpo humano, pela sua nova perspetiva sobre o corpo, que desafia o mundo internacional da arte figurativa, e pela sua influência positiva nas gerações mais jovens de artistas africanos. Em abril de 2012, Sow foi eleito Membro Associado Estrangeiro da Academia das Belas Artes do Instituto da França, substituindo Andrew Wyeth, tornando-se a primeira pessoa negra eleita como membro. Foi admitido na Academia de Belas Artes da França em dezembro de 2013, o primeiro africano a entrar nessa instituição. Desde então, o seu trabalho já foi exibido em mais de dezenas de lugares, incluindo o Museu Whitney, em Nova York. Ousmane Sow construiu a sua própria casa, hoje museu, como uma escultura: uma verdadeira obra de arte com azulejos em tons de ocre, castanho e vermelho, e paredes revestidas com os materiais que ele usou nas suas esculturas. As obras da série Afro-Africana estão expostas em todas as salas. Para as séries incompletas, as fotos das estátuas em falta são apresentadas, proporcionando assim uma visão geral da série, especialmente a dos "Grandes Homens", em homenagem aos grandes homens que marcaram sua vida, como o seu pai, Victor Hugo, General de Gaulle, Nelson Mandela, para além de arquivos e memórias pessoais. Ousmane Sow morreu a 1 de dezembro de 2016, aos 81 anos de idade. Ele foi a “expressão monumental da ancestralidade e da modernidade africanas”. Num olhar eurocêntrico, houve quem o considerasse um Rodin africano, mas Ousmane Sow era um artista singular e irrepetível. Personificação do amor pela liberdade, pelo continente africano e pelo Senegal, ele era uma lenda viva da escultura contemporânea. As suas criações foram verdadeiros monumentos e os seus sujeitos são grandes figuras históricas, hoje exibidas pelo mundo inteiro e que lhe deram uma enorme reputação internacional. Oiça a emissão "África em Clave Cultural: personagens e eventos" de 30/10/25 a ele dedicada.