Castel Gandolfo vai sediar, de 28 a 30 de novembro, o “Restarting the Economy” (“Retomar a Economia”), um encontro global, promovido pela Economia de Francisco. Trata-se de um acontecimento internacional para retomar a economia à luz do Jubileu, entre justiça social, cuidado com a Terra e libertação da dívida.
Rita Sacramento Monteiro Desde o início da nossa história, a criatividade e o engenho humanos permitiram-nos superar os limites, criar e modelar novas realidades. O mundo contemporâneo é testemunha disso pelos avanços da tecnologia e engenharia. Superar os limites faz parte das nossas origens, somos cocriadores de Deus, e dos nossos desejos mais profundos: buscamos novas possibilidades e temos ânsia de nos expressar. Ir além dos limites sempre nos fez descobrir e desvendar novas realidades; mas, em um mundo, marcado por desequilíbrios ecológicos — sobre a Terra, nos seres vivos e nas vidas humanas — as limitações carregam um significado e uma força, que devem ser redescobertos em nosso tempo. Em geral, as limitações, associadas a algo negativo, que parece restringir nossa liberdade, não anulam as possibilidades, mas suscitam novas. Do latim, a palavra ‘limes, limitis’ — que evocam fronteiras, margens, linhas de separação — indicavam, no mundo romano, um caminho que assinalava um confim, mas não um muro; um caminho, através da terra, que indicava onde começar e onde terminar. As limitações trazem consigo um importante senso de suficiência, acolhimento, aceitação. Diante de um limite, podemos contemplar o que nos transcende; ao reconhecer a nossa vulnerabilidade, podemos entender o quanto nos ultrapassa. Assim, ao reconhecer a realidade como ela é, as decisões podem ser tomadas, a criatividade renasce, algo novo surge. No entanto, nossas sociedades parecem ter-se tornado obcecadas, não apenas em superar limites, mas em eliminá-los. Nada nunca é suficiente: crescimento, velocidade, consumo material e digital, horas de trabalho e assim por diante. Quanto mais sabemos, menos sabemos e continuamos a rejeitar os limites. Chegamos até a criar a ilusão de que a ciência e a tecnologia podem resolver todas as dimensões da nossa existência — até a morte — sendo fonte da vida e de significado. Isso, paradoxalmente, limita a nossa liberdade e o nosso desenvolvimento humano integral. O Jubileu deste ano é como um caminho, traçado na terra, que nos indica onde começar e terminar; é uma linha que marca uma fronteira, e que abre, no tempo e no espaço, uma oportunidade de libertação, renovação e descanso. Trata-se de um limite que nos incita a pôr fim ao que não deve mais continuar: desigualdade, pobreza, guerras, esgotamento de recursos; é um ritmo digital inquieto, que não é nosso, mas um acumulo desenfreado que prejudica a dignidade humana e a Terra; é um convite a redescobrir o valor dos limites, como um caminho para a liberdade, reconhecendo o que é essencial, e um desafio a uma "Economia do Suficiente", uma economia que coloca o bem comum no centro, que gera esperança e abre horizontes, ao invés de os fechar; é uma economia em que existem limites, que são traçados para salvaguardar a justiça para todos os seres vivos. Enfim, não se trata apenas de um convite para olhar o crescimento ou os recursos de forma diferente, nem se resume, simplesmente, em limitar o acúmulo de riquezas, o poder ou as desigualdades. Os limites não são apenas técnicos ou materiais, mas, antes de tudo, humanos e espirituais; são um convite a repensar todos os nossos relacionamentos. Ao buscarmos retomar a economia, neste ano favorável do Jubileu, devemos encará-la sob a perspectiva dos limites, que significa reconciliar nossa relação com Deus e com a Terra. Somos criaturas limitadas, infinitamente amadas, mas limitadas. Não criamos o mundo; ele nos foi dado por Deus como dom, com o qual podemos frutificar, gerar frutos. Se continuarmos a vê-lo como um "objeto” a ser explorado, continuaremos a explorá-lo, sem cessar, inclusive as pessoas. Precisamos redescobrir este mundo como um lar vivo, ao qual pertencemos. A partir de tal experiência, colocando-nos na posição correta de quem reconhece seus limites, conseguimos enraizar uma atitude de responsabilidade e zelo. Com esta raiz, conseguimos desenvolver relacionamentos melhores entre nós e conosco mesmos. Uma “Economia do Suficiente" poderia abrir o caminho para um estilo de vida mais simples, no qual compartilharmos mais, sabendo que, nem nós nem os outros, somos definidos pelos bens materiais, mas por aquilo que somos. Não se trata de viver pior ou ser mais infeliz, mas de viver na gratidão, libertando-nos da ideia de que as coisas — e nós mesmos — jamais são suficientes, tornando-nos guardiões uns dos outros. Devemos dar tempo e espaço ao que realmente importa, como um abraço, por exemplo, um limite que nos permite fazer uma experiência de amor! O Jubileu exige o que nem sempre é possível e, às vezes, até parece impossível: perdão, libertação..., mas se pudesse se tornar possível, com mais frequência? Se a nossa economia pudesse, realmente, recomeçar e se tornar, não um lugar de luta, desejo insaciável ou esgotamento, mas um espaço com limitações, que possam favorecer florescimento, descanso, contemplação da beleza e bons relacionamentos? Neste momento, em que este Ano jubilar está chegando ao fim, eis que nos chega o convite para redescobrir os limites, nossos e os da Terra e da economia, que não acabam com o fim do Jubileu. Pelo contrário, se fortalecem. De quais limites as nossas vidas precisam hoje?