A busca incansável pelo Rosto de Deus

A busca incansável pelo Rosto de Deus
Fonte: VATICANO
A "busca incansável pelo rosto de Deus tem um lugar especialíssimo de encontro. “Na liturgia, a Igreja se manifesta em toda a sua esplendida e divina pobreza, porque ali se mostra em sua realidade mais profunda, como a Esposa que recebe tudo do Esposo. Na Liturgia, o rio eterno é derramado sem medida e nós podemos beber da sua Água diretamente na fonte”.
 

Jackson Erpen - Cidade do Vaticano

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"A oração cristã é uma relação de aliança entre Deus e o homem em Cristo. É ação de Deus e do homem; jorra do Espírito Santo e de nós, toda orientada para o Pai, em união com a vontade humana do Filho de Deus feito homem (CIC 2564)".  Mas, de onde procede a oração do homem? O Catecismo da Igreja Católica explica, que "seja qual for a linguagem da oração (gestos e palavras), é o homem todo que ora. Mas para designar o lugar de onde brota a oração, as Escrituras falam às vezes da alma ou do espírito ou, com mais frequência, do coração (mais de mil vezes). É o coração que ora. Se ele estiver longe de Deus, a expressão da oração será vã" (CIC 2562).

"A busca incansável pelo Rosto de Deus" é o tema da reflexão que Pe. Gerson Schmidt* nos propõe esta semana:

 

"Vemos em toda a Sagrada Escritura uma busca incansável pelo rosto de Deus. Havia, no Antigo Testamento, uma concepção de que não poderia continuar vivendo o homem que visse a face de Deus. Todos buscamos ver o rosto de Deus, tal como Moisés. Cristo, na plenitude dos tempos, desvelou visivelmente o rosto invisível de Deus, outrora tão encoberto e escondido. "Alegre-se o coração dos que buscam o Senhor!", reza o Salmista (Sl 105,3). E no Salmo 26 há uma súplica clara pela visão beatífica: “Meu coração fala convosco confiante e o meus olhos vos procuram. Senhor, é a vossa face que eu procuro; não me escondais a vossa face” (Sl 26,8)”. 

O Catecismo da Igreja Católica, diz no número 30: "Alegre-se o coração dos que buscam o Senhor!" (Sl 105,3). Se o homem pode esquecer ou rejeitar a Deus, este, de sua parte, não cessa de chamar todo homem a procurá-lo, para que viva e encontre a felicidade. Mas esta busca exige do homem todo o esforço de sua inteligência, a retidão de sua vontade, "um coração reto", e também o testemunho dos outros, que o ensinam a procurar a Deus” (CIgC,30).

Os monges Cartuxos escrevem que só um verdadeiro desejo de ver o “rosto de Deus” pode nos sustentar nesse percurso do coração[1]. A visão de Deus é a bem-aventurança prometida por Jesus aos puros de coração, mas a imagem distorcida de Deus que se revela na nossa oração, nos expõe que o nosso coração não é “puro”, ou seja, não é capaz de receber em pobreza somente amor e de doar somente amor”. Por isso, é necessário que a graça do Espírito o qual ensina a Jesus a dizer “Pai”, nos ensine também a dizê-lo com Jesus, da mesma forma e com o mesmo significado. Ou melhor, que seja Ele mesmo, o Espírito a dizê-lo em nós, fazendo-nos uma só e mesma coisa com Cristo: "tende entre vós os mesmos sentimentos que havia em Cristo Jesus” (Fl 2,5).  

E apontam os monges, nesse aprofundamento do Caderno de Oração de número 6: “Só quando o Espírito tornar o nosso coração tão pobre a ponto de fazer nosso o grito de Súplica do filho (Mc 14,36), de estar conscientes de ter uma necessidade extrema da Graça, só então poderemos dizer verdadeiramente com Jesus e como Ele: Abbá, Papai preciso de ti. Sem ti não posso fazer nada.  Sendo assim, seremos verdadeiramente crianças, podendo deste modo acolher plenamente o dom do Reino, dom da verdadeira oração, apenas quando nos deixarmos crucificar pela humilhação de não saber e não poder viver esta vida nova do Reino com as nossas próprias forças. Aceitação de nossa pobreza pessoal, física, psicológica e moral é o único meio pelo qual podemos receber a glória divina já presente em nós. Aceita como humildade e confiança, essa pobreza perpétua torne-se o lugar e o meio pelo qual podemos dizer a Deus Abbá. Torna-se a nossa morte, torna-se a nossa Páscoa, o nosso caminho diário ao Pai e a nossa ressurreição”[2].

O Espírito Santo se derrama e age no íntimo de cada de nós, atraindo-nos secreta e poderosamente para a Fonte de onde Ele mesmo emana, para o coração de Cristo e para o coração do Pai. Como já dizia Santo Inácio de Antioquia: “Há em mim uma água viva que fala, dizendo: vem ao Pai”[3]. O Espírito suscita e mantém viva em nossos corações essa sede da Água viva, essa saudade do Rosto do verdadeiro Deus. Deus deixou-nos a sua imagem impressa. Deixou-nos em nosso íntimo com amor, amor inexplicável, a “memória” de seu olhar. E desde esse momento o nosso coração está irrequieto, até reencontrar esse olhar amoroso. Nossa alma tem sede de Deus, está sedento desse rosto nostálgico. Uma das frases mais famosas de Santo Agostinho diz: "Fizeste-nos para vós, Senhor, e inquieto estará o nosso coração, enquanto não repousar em vós"[4].

Essa busca incansável pelo rosto de Deus tem um lugar especialíssimo de encontro. “Na liturgia, a Igreja se manifesta em toda a sua esplendida e divina pobreza, porque ali se mostra em sua realidade mais profunda, como a Esposa que recebe tudo do Esposo. Na Liturgia, o rio eterno é derramado sem medida e nós podemos beber da sua Água diretamente na fonte”[5]. Essa Água viva – o Espírito Santo de Amor – nos é dada na medida da nossa sede, na medida do nosso desejo, na medida da nossa pobreza e abertura interior. Que esse ardente desejo de ver o rosto do Amado, seja sempre a vontade mais fundamental e radical de nossa vida."

*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
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[1] Monges Cartuxos – Dicastério para a Evangelização - A Igreja em Oração – Cadernos sobre a Oração 6, p. 38-39.
[2] Idem 39-40.
[3] Idem, 59.
[4] Santo Agostinho, As Confissões, I, 1,1
[5] Monges Cartuxos – Dicastério para a Evangelização - A Igreja em Oração – Cadernos sobre a Oração 6, p. 60.

 
 

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