• A+
  • A-


Unknown

III. UM CORAÇÃO ENORME

A alegria de apóstolo

 

Quem conheceu Guadalupe sempre se lembra do seu sorriso e seu bom humor. “O que é preciso para conseguir a felicidade não é uma vida cômoda, mas um coração enamorado88, repetia São Josemaria e parece que Guadalupe soube encarnar essa lição. Um coração enorme, cheio de amor a Deus, iluminava a vida e a oração de Guadalupe, e a animava a compartilhar esse tesouro com quem estivesse ao seu lado. Um coração enorme em que se juntavam o céu e a terra. Um coração vigoroso de apóstolo, de filha, de irmã, de amiga.

Bilbao, 1 de outubro de 194689

Padre: Ontem chegaram o padre Álvaro [del Portillo] e o padre Pedro [Casciaro]. (...). Que alegria! Pediram que rezemos muito pela casa grande de Roma e alguns procedimentos que o senhor está fazendo por isso nesses dias. Rezaremos com toda a nossa alma, ainda que, nesses dias, talvez esteja um pouco impaciente e chateie minhas irmãs; assim que não se lembram de algo ou acho que colocam pouco interesse, eu digo e talvez às vezes, principalmente com Consi e Roser, devesse me calar; até cheguei a ter remorso na oração, caso não as queira como a todas as outras que passaram por aqui; claro que estou disposta a retificar e viver pendente delas, até colocar nelas este interesse em tudo o que Deus (sem luta e, portanto mérito nenhum) colocou em mim, porque com certeza não teria tido forças se tivesse me custado algum esforço.

Bilbao, outubro de 194690

Padre: (...) com José (...) nos disse principalmente “que nos façamos querer” por todos os que nos rodeiam. Tem muita razão! Eu gostaria de conseguir, principalmente com as minhas irmãs; que encontrem em mim esse coração grande que Deus sabe colocar em nós quando nos entregamos de verdade. Peça para que o consiga e lembre-se muito de sua filha.

Bilbao, 3 de novembro de 194691

Padre: ontem nos disseram que o senhor não virá a Bilbao; estávamos muito ansiosas para vê-lo, mas se não pudermos, estamos contentes também, reze muito por nós que é o que importa para cada vez estejamos mais perto de Deus. Queria muito lhe dizer que quero fazer a Fidelidade92 o quanto antes. Padre, mesmo que eu ainda não tenha cumprido o mínimo de anos para isso, tenho a sensação de que estou na Obra toda a minha vida, porque tudo o que vivi anteriormente parece que foi outra pessoa que viveu (e confio em que Deus também terá esquecido, não é?). (...)

Padre, acho que alguma vez eu disse que não tinha Cruz, porque nada do que eu fazia me custava trabalho; pois agora acontece a mesma coisa, mas vou encontrando cruzes: preocupações pelas outras, ver minhas irmãs com lutas, perceber que as jovens não reagem bem, e me sentir sem força para evitá-lo; mas procuro carregá-las com alegria e fazer o que posso, e encarrego Deus de todo o resto.

Bilbao, 17 de novembro de 194693

Padre: às vezes, a fé e a segurança que tenho quando peço alguma coisa me assustam. Falei para o padre José, caso fosse vaidade, mas ele me tranquilizou, e simplesmente agradeço a Deus.

Talvez eu seja muito exigente com as minhas irmãs, não deixo de dizer nada do que não fazem bem e, ainda que as ame e reze por elas, e seria capaz de qualquer coisa para ajudá-las quando vejo que lutam, não demonstro isso a elas e sou dura — deveria ser mais compreensiva.

Digo tudo isso ao padre José e estou disposta a lutar com todas as minhas forças e a pedir muito para ter um coração muito grande. Ajude-me!

Quando estamos as cinco reunidas nos divertimos muito e como já sabe que eu sou a mais “gansa”94 procuro que riam, mas geralmente conservo a presença de Deus. No exame particular95 penso na alegria e presença de Deus e (...) peço a Deus que me ajude a tê-las. Reze por mim.

Bilbao, 17 de dezembro de 194696

Padre: no dia 13, Marichu e Raquel vieram de manhã e Pilarín e Consi foram embora à tarde, todas muito contentes. As jovens que frequentam aqui ficam assombradas com a alegria que temos em estar juntas e também de nos separarmos.

Marichu nos contou muitas coisas de todas as casas, e nos disse que o senhor escrevia contente, e que quando vier de Roma vai estar conosco e haverá muitas vocações. Que bom! Cada vez que alguém se decide [a seguir nosso caminho], me dá muita alegria (como nada mais). (...)

Bilbao, 25 de janeiro de 194797

Padre: Nisa nos mandou uma cópia de uma carta sua. Quanto ânimo nos dão as coisas que o senhor nos diz! Garanto que todos os dias colocamos alegria em tudo o que fazemos. Se o senhor visse o quanto nos divertimos hoje! Ao terminar o lanche da tarde, como era domingo, ficamos nós 4 uns instantes com Gloria na cozinha (...) e com Ricarda (...), e ficamos conversando com elas. Depois cantamos baixinho canções bascas, e no fim, Padre, até dançamos uma sardana que Roser nos ensinou. Elas estavam descascando batatas e tão felizes.

Depois subimos para fazer oração e tenho certeza de que todas rezamos por elas. (...) Depois da nossa oração, desci com Caminho (...) [para o quarto de Maria, a cozinheira que estava na cama com febre], (Felisa também estava) e lemos o capítulo “A Virgem”. Assim passaram a tarde de domingo as suas filhas de Abando. (...)

Amanhã o padre José pregará o recolhimento para elas. Pode ser decisivo para algumas. Muitas jovens continuam frequentando aqui (...). Muitas ainda não entendem bem a Obra, outras já nos querem muito bem. Padre, sou ambiciosa, queria que todas as que vêm aqui tivessem vocação e fossem tão felizes como nós ou que pelo menos fossem pegando nosso modo de ser; acho que se rezarmos muito conseguiremos.

Padre, me dá pena não fazer muito bem a oração, reze por mim, para que Deus me ensine, com certeza Ele ouve mais o senhor do que a sua filha.

Bilbao, 24 de março de 194798

Estamos muito felizes, e tão alegres que, às vezes, acho que rimos demais. Os poucos momentos em que estamos reunidas nos divertimos com tudo, tanto que o senhor não pode imaginar. Eu, às vezes, perco a seriedade e me faço de palhaça; é como uma explosão que não posso controlar. Enfim, não creia que é excessivo; e Deus faz com que, apesar de tudo, me respeitem muito.

Los Rosales (Madri), 25 de junho de 194799

Padre: já começamos o curso100, somos 13 e todas estão contentes e com muita vontade de melhorar. A casa está muito alegre e todas as que já fizeram a confidência comigo são muito sinceras e simples. (...) Para mim, tudo é uma lição, estou muito tranquila e percebo muito claramente que Deus me ajuda.

Estamos trabalhando na granja e no tear, e também na casa. As aulas são um verdadeiro exame da nossa vida na Obra. Ajude-me a aprender a ter muito amor a Deus para transmiti-lo para as minhas irmãs, isto é o que peço com mais força desde que estou aqui. (...)

Reze muito por mim, e mande-me para onde quiser e como quiser, sempre. Onde quer que eu esteja, coloco tudo o que tenho e Deus se encarrega do resto.

 

México D.F., 20 de outubro de 1950101

Falo muito com as residentes; por elas não há dificuldade, pelo contrário, estão desejando uma oportunidade para me contar do início ao fim, tudinho.

Confiam completamente em nós, isto é maravilhoso. Às vezes, sofro muito porque vejo como algumas estão afastadas de Deus. É muito comum encontrar meninas de uns 20 anos que acham que perderam a fé. Isso não é verdade (graças a Deus) quase nunca, mas elas precisam perceber. Dá para ajudá-las bastante. Pela primeira vez na minha vida, senti que em alguns momentos, para ajudar a uma dessas jovens, Deus me impelia a rezar mais, sacrificar-me mais e a falar com elas. Tenho certeza de que o senhor entende tudo isso, e acho que não está mal, não é? Mas pode ter certeza de que para mim o mais importante, neste momento, são as nossas e as que serão em breve.

México D.F., 11 de novembro de 1954102

Padre: Faz muito tempo que não lhe escrevo diretamente, ainda que sempre que escrevo para Roma penso que a carta é para o senhor, e ao contar as coisas que acho que são boas, gosto de pensar que lhe darão alegria; e ao dizer as coisas que me preocupam, sinto que o senhor rezará por nós para retificar ou para fazê-las bem.

Mas hoje quero falar de mim, não sei se vou conseguir, porque com o hábito de pensar nas outras, já não penso em mim. Isso faz com que, às vezes, eu não saiba nem me confessar bem, nem fazer a confidência. Não é que me cale (percebendo que devo dizer algo), e sim que não afino nos detalhes.

Cumpro as normas103 o melhor possível (mesmo que às vezes, não complete o rosário e a leitura). Cumpro o horário, procuro ter ordem, venço meu caráter, faço mortificações pequenas (minuto heroico, modo de me sentar, na comida, em fazer o que devo em cada momento, controlar a imaginação).

Dou muita importância aos círculos e aulas que tenho que dar (preparo bem); nas confidências (...) procuro ganhar confiança e que me queriam bem, embora nem sempre consiga (talvez porque me veem mais de perto, não dou a elas o exemplo necessário). (...) Geralmente procuro ter presença de Deus muito forte em toda a conversa, e dar poucos conselhos e só os que vejo muito claro.

Tenho poucas oportunidades de falar com meninas mais jovens e, além disso, acho que já é preferível que alguém de idade mais parecida com as delas faça isso. Gostaria de sempre estar de acordo com a minha idade no labor também.

Espiritualmente, tenho paz e alegria sempre. Geralmente não perco a presença de Deus; embora às vezes não me faça evitar o que devo (quero dizer que não é tão eficaz). A oração não é muito intensa. Tenho muita fé, confiança e amor (mas não o sinto quase nunca).

O que mais me faz sofrer é a falta de entrega ou de perseverança das nossas. Mas nem isso influencia no meu ânimo.

Acho que estou desapegada das coisas e das pessoas. Não é que seja indiferente a tudo e a todas, mas não é difícil prescindir delas a qualquer momento. Algumas vezes não fiz bem as contas; embora nunca tenha feito gastos supérfluos nem para mim, nem para a casa. Mas por falta de tempo não a fiz centavo por centavo.

Meu exame particular é dizer jaculatórias pedindo pelo Colégio Romano104. Já que materialmente posso conseguir tão pouco, pelo menos constantemente peço a Deus que se consiga tudo o que se precise.

Madri, 25 de setembro de 1959105

Padre: gostaria que esta carta chegasse antes do 2 de outubro106 para que tenha certeza de que, nesse dia, pedirei a Deus de um modo muito especial por tudo o que senhor pedir e agradecerei tudo o que o senhor agradece. Colocando-me, como sempre, nas mãos de Deus, do Padre e de minhas irmãs dizendo sinceramente que quero servir, para o que me disserem (...). Cada dia tenho mais entusiasmo no que me encarregam, seja o que for.

Agora me ocuparei bastante de São Rafael em Montelar107. Reze pelo labor; o número de jovens que vem aqui é enorme e elas são tão maravilhosas que poderiam nos entender completamente e encaixar na Obra. (...)

Padre, graças a Deus, estou muito forte, com o coração jovem e saudável, mas maior a cada dia; como cabem coisas dentro e com que intensidade se ama em Casa!

Madri, 21 de novembro de 1959108

Padre: (...) quero contar sobre o labor de São Rafael em Montelar109, que é o que está ocupando quase todo o meu tempo neste ano e onde minha oração sempre acaba concentrada: em nomes de jovens que tratamos ali, depois de pedir por Roma, pelo senhor e pelo mundo inteiro. A maioria das jovens têm um aspecto muito moderno e poucas coisas sérias dentro da cabeça. Mas são muito boas e querem se preencher com outras coisas! Padre, temos que ajudá-las muito. Reze por elas e por nós. Que saibamos ver por trás desse aspecto as possibilidades de cada uma e que haja muitas vocações. O ambiente está cada vez melhor. Vão adquirindo inquietação espiritual. Vão conhecendo a Obra por meio dos círculos de São Rafael110 e do contato com as nossas casas e conosco. Começam a ter direção111. E já estamos preparando o segundo retiro em Molinoviejo. Querem trabalhar e ser úteis, então organizamos aulas de catequese, reforço escolar, círculos e aulas para jovens mais simples, etc., em dois subúrbios de Madri, e já temos quase cem jovens de São Rafael trabalhando. Poderia contar detalhes preciosos. Hoje apareceu uma menina (de uma família bem conhecida, que ao começar o curso era uma menina frívola) com um buquê de flores imponente, e nos perguntou, ficando um pouco vermelha, se podia colocá-lo ao lado do Sacrário. Muitas fazem um tempo de oração. Quase todas cumprimentam Jesus no Sacrário ao chegar e ao ir embora. São detalhes pequenos que nos enchem de alegria.

Madri, 29 setembro de 1961112

É verdade que dói que exista gente que não entende. Mas dá muita alegria ver quantas — cada vez mais — se entregam com todas as suas forças e se fundem no labor — justamente porque veem que é urgente chegar a tempo — a muitas atividades e a muitos setores — esquecendo-se de seus pequenos problemas pessoais. É para agradecer muito a Deus.

Padre, fico sem dizer o melhor, porque sou incapaz de expressá-lo. Mas o senhor já sabe: aqui estou, quero servir com toda a minha alma.

Valência, 2 de fevereiro de 1973113

Querido Padre: estou passando alguns dias em Valência por motivos profissionais e quero escrever daqui para o senhor.

O motivo foi dar uma palestra na Feira “Textil-Hogar” 1973. Já foi tudo e acho que saiu tudo bem. Essas coisas não me tiram o sono, embora as prepare e procure dar o melhor de mim.

A coisa mais importante do meu currículo é ser professora do Centro de Estudos e Pesquisas de Ciências Domésticas [CEICID]; isso me enche de alegria. Às vezes, penso que já não tenho forças físicas para essas coisas, mas vou fazendo e parece que Deus se empenha em que o faça, porque tudo sai perfeito e quase não há maneira de dizer que não.

Padre, lembro muito de sua visita a Madri, ao centro do CEICID e tudo o que nos disse. Reze por nós e por mim especialmente, para que faça o que Deus quer sempre.

Os médicos me examinaram outra vez e parece que meu coração cresce (que doença tão profunda). Enfim, o importante é que seja inteiro para Deus (grande ou pequeno).

Receba a Liturgia Diária no seu WhatsApp


Deixe um Comentário

Comentários


Nenhum comentário ainda.


Acervo Católico

© 2024 - 2025 Acervo Católico. Todos os direitos reservados.

Siga-nos