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As Grandes Maravilhas De Fátima

12. A GRANDE PEREGRINAÇÃO NACIONAL

(13 DE OUTUBRO DE 1927)

Primeiras chuvas do Outono
O décimo aniversário da última aparição
Movimento de peregrinos
Chegada a Fátima
A procissão das velas

A triste e melancólica estação outonal, depois de muitos dias verdadeiramente primaveris, de sol brilhante e de céu sem nuvens, assinala a sua existência com frequentes bátegas de água e violentas chuvas torrenciais. É no meio da luta dos elementos desencadeados, em plena revolta armada da natureza, que se inicia e se leva a cabo a grande peregrinação nacional de 13 de Outubro.

De vários pontos do país, numerosos grupos de pessoas tinham partido a pé, muitos dias antes, em dura e quase heróica peregrinação de penitência, a fim de se associarem em Fátima às solenes comemorações do décimo aniversário da sexta e última aparição de Nossa Senhora do Rosário aos humildes e rudes, mas inocentes pastorinhos de Aljustrel.

No dia doze o movimento de peregrinos, que se servem de todos os meios de transporte ao seu alcance, toma de repente um incremento extraordinário, quase assombroso, inundando, às primeiras horas da tarde, a Cova da Iria e as suas imediações de milhares de veículos, de diversos feitios e tamanhos, e duma multidão de indivíduos de ambos os sexos e de todas as idades, classes e condições sociais. Às dez horas da noite, a camionette que nos conduz à estância privilegiada da Augusta Mãe de Deus, pára na estrada distrital, a algumas centenas de metros do local das aparições.

É nessa ocasião que principia a procissão das velas. Querer descrever o que foi esse espectáculo grandiosíssimo e assombroso, é pretender o impossível. Nunca em Portugal, nunca talvez no mundo inteiro, nem mesmo em Lourdes, a divina cidade dos Pirenéus, se visse uma manifestação religiosa tão grande na singeleza da sua estrutura, tão saturada de fé e piedade, tão estuante de ternura e amor filial para com a celeste Padroeira da Nação. Ninguém, por mais tíbia que fosse a sua crença, era capaz de contemplar de olhos enxutos aquele cortejo imponentíssimo, em que tomavam parte dezenas de milhar de pessoas, cada uma com a sua vela acesa na mão, cantando os louvores da Virgem. A deslumbrante procissão levou quase três horas a desfilar, realizando um percurso de alguns quilómetros em torno do muro que circunda o local das aparições. As turmas de peregrinos que se precipitavam em torrentes caudalosas pela abertura do arco triunfal, as filas múltiplas e intermináveis que circulavam por toda a parte no recinto sagrado, o canto do Avé de Lourdes repetido ao mesmo tempo em milhares de coros, por dezenas de milhar de vozes, num sem número de tons, desde o mais agudo ao mais grave, a solenidade do momento e o ambiente sobrenatural que tudo envolvia, constituíam um espectáculo duma beleza e dum encanto inigualáveis, que deslumbrava os olhos, assombrava as almas e empolgava os corações.

E todas aquelas dezenas de milhar de pessoas, que tomavam parte na procissão das velas, traduziam os seus sentimentos em exclamações de surpresa e em lágrimas da mais viva e intensa comoção.

E quando, ao terminar o deslumbrante cortejo, aquelas legiões de almas proclamam sem respeito humano a sua fé diante de Jesus-Hóstia, encerrado no Sacrário da Capela das Missas, cantando com entrain os sublimes artigos do Credo, o entusiasmo popular atinge as raias do delírio e a manifestação assume as proporções duma verdadeira apoteose.

A adoração nocturna
Preces e cânticos
A pregação do venerando Bispo de Leiria
Peregrinação diocesana de Viseu
Inauguração oficial de oito megafones.

Cerca da meia-noite principia a adoração nocturna. O Rei do Céu e da terra, oculto sob as espécies de pão no seu Sacramento de amor, é exposto solenemente ao culto dos fiéis numa riquíssima custódia de ouro, no alto dum trono de lumes e flores. Pela primeira vez, dois venerandos Prelados tomam parte oficial nas solenidades religiosas do dia treze. Revestidos com as vestes episcopais, iniciam a sua participação, prostrando-se aos pés do trono de Jesus-Hóstia, a fim de Lhe renderem as homenagens da sua adoração e de Lhe testemunharem o seu amor. Ia começar a primeira hora de adoração, presidida pelo ilustre antístite de Leiria, que a Virgem Santíssima escolheu, como primeiro Bispo da diocese restaurada, para assumir sobre os seus ombros a empresa gigantesca (de fazer surgir dum terreno deserto e pedregoso a obra prodigiosíssima dos augustos santuários de Fátima).

Durante a hora de adoração, o rev.do dr. Marques dos Santos reza o terço do Rosário alternadamente com o povo. Nos intervalos das dezenas, depois de recitada a oração jaculatória que a Virgem ensinou aos pastorinhos, o Senhor Bispo de Leiria explica, numa prática ao alcance de todas as inteligências, o sentido do mistério seguinte. Como o dia treze ocorreu este mês numa quinta-feira, os mistérios meditados foram os mistérios gozosos.

1º Assim como o Anjo apareceu a Nossa Senhora na modesta Casa de Nazaré, assim Nossa Senhora apareceu aos humildes pastorinhos.

2º Assim como Nossa Senhora visitou sua prima Santa Isabel, assim nós devemos visitar os pobrezinhos, os enfermos e encarcerados, propagando sobretudo as Conferências de S. Vicente de Paulo.

3º Em honra do Menino Jesus, que nasceu na lapinha de Belém, porque os parentes e amigos o não quiseram receber em suas casas, devemos nós olhar pelas criancinhas que vivem abandonadas, quer material quer espiritualmente, porque o egoísmo duns e a incredulidade doutros assim o determina.

4º Assim como Jesus foi apresentado no templo e depois foi baptizado, nós devemos vigiar para que os meninos sejam baptizados sem perda de tempo e levados à igreja desde a mais tema idade para ali receberem a instrução religiosa que, porventura, não possam ter na casa e na escola.

5º Porque o Menino Jesus, tão novinho, já pregava no templo, devemos nós lembrar-nos dos seminaristas, futuros pregadores da palavra de Deus, amparando-os moral e materialmente com orações e conselhos, mais ainda do que com esmolas, todavia bem precisas para sustentação dos Seminários.

A segunda hora de adoração foi privativa da peregrinação diocesana de Viseu e presidida pelo Rev.do P. Marinho, seu director. As orações e os cânticos, tão lindos e tão comoventes, atraíram até junto da capela milhares de peregrinos que estavam afastados.

Desde a meia-noite que os sacerdotes inscritos no respectivo registo principiaram a celebrar a Santa Missa em quatro altares, sucedendo-se uns aos outros sem interrupção. Tinham-se inscrito mais de cem sacerdotes, tendo ficado sem celebrar muitos que o não haviam feito com a devida antecedência.

Foi nesta noite para sempre memorável, que se realizou a inauguração oficial de oito megafones de extraordinária potência, instalados pelo distinto engenheiro Rocha e Melo, da fábrica de cimentos de Maceira, que faziam ecoar por todo o vasto recinto, com grande admiração do povo, as preces, os cânticos e as palavras dos oradores e dos dirigentes dos actos religiosos.

O senhor Bispo de Beja e os servitas
Peregrinação de Lisboa, Porto, Coimbra
Braga, Viseu, Alcobaça, Porto de Mós, etc.
A missa do venerando Bispo de Leiria e a comunhão geral
No Posto das Verificações médicas
A legião dos doentes
A chuva torrencial.

Às três horas da madrugada, depois de dada a bênção geral com o Santíssimo Sacramento, que em seguida é reposto no sacrário, o senhor D. José do Patrocínio Dias, ilustre Bispo de Beja, celebrou a missa dos servitas. O venerando prelado distribuiu o Pão dos Anjos aos servitas e escuteiros que o recebiam com visíveis sentimentos de piedade, edificando todos os circunstantes com o seu recolhimento e fervor.

Foram numerosas e importantes as peregrinações que de diversos pontos do país vieram a Fátima tomar parte nas solenidades comemorativas da sexta aparição. Merecem especial referência as de Lisboa, Porto, Braga, Coimbra, Viseu, Alcobaça e Porto de Mós.

Esta última só chegou na manhã do dia treze. Era composta de cerca de oitocentas pessoas de todas as freguesias do respectivo concelho e presidida pelo rev.do Francisco Carreira Poças, que a promoveu e que celebrou a missa da peregrinação. A de Alcobaça constava de quatrocentas pessoas, sendo metade só da vila, e era dirigida pelo rev.do pároco Henrique Vieira.

Às sete horas o ilustre Bispo de Leiria celebrou a missa de Comunhão geral. Ao Communio, um grupo de dez sacerdotes distribui a sagrada comunhão a mais de nove mil fiéis. No Posto das verificações médicas procede-se ao exame e inscrição dos doentes que, ao receberem a senha de ingresso no Pavilhão, se dirigem imediatamente para ali.

São centenas de vítimas de todas as misérias físicas que torturam a humanidade e que ali se reúnem como em Lourdes para implorar de Aquela que é chamada a saúde dos enfermos e a consoladora dos aflitos, lenitivo para as suas dores e conforto para as suas almas.

Durante toda a manhã a chuva caiu, por várias vezes com violência, mas a intervalos. Depois da Missa dos servitas, redobrou de violência, encharcando completamente o local das aparições.

Curas sensacionais
Uma paralítica de Viseu
Um doente de mal de Pott, de Braga
Lágrimas de alegria duma mãe
O interesse da imprensa
A opinião dos médicos

No pavilhão dos doentes, junto do parapeito da capela das missas, está sentada em cima dum colchão, ao lado doutros farrapos humanos, uma rapariga, que parece ter pouco mais de vinte anos de idade.

Vinca-lhe o rosto pálido e macerado uma expressão de íntimo júbilo e nos seus olhos brilha um clarão de suave e fagueira esperança. Uma paralisia geral consecutiva a uma queda desastrosa, imobilizara por completo no grabato dum hospital o seu corpo franzino e mirrado. Dores horríveis atormentavam-na sem cessar.

Almas caridosas promoveram uma subscrição para que ela pudesse tomar parte na peregrinação diocesana de Viseu. Durante a viagem toma leite e, ao contrário do que costumava suceder, não o vomita.

As dores abrandam consideravelmente. À passagem da peregrinação de Alcobaça, quando se aproxima dela o estandarte em que está pintada a cena das aparições, sente que uma força estranha a impele a ajoelhar-se e após doze anos consegue pela primeira vez tomar essa posição. Uma alegria mista de inquietação e temor apodera-se da sua alma e transborda-lhe dos olhos, dos lábios, de todo o seu ser. A servita que está ao seu lado anima-a e conforta-a, inspirando-lhe confiança no poder e na bondade da Mãe de Deus.

Aproximamo-nos dela e interrogamo-la. Dominada por uma comoção profunda, responde com extrema dificuldade às perguntas que lhe fazemos.

Durante a viagem de regresso as melhoras acentuam-se de hora para hora e é já por seu pé que entra no hospital donde tinha saído em braços para a partida.

Entre os doentes da peregrinação de Braga, encontra-se ao colo da mãe uma criança do sexo masculino, de sete anos de idade, atacada, segundo o diagnóstico médico, duma doença terrível, o mal de Pott. Filho de Manuel Fernandes Braga, um poço de doença, tuberculoso e alcoólico, já falecido, e de Maria da Conceição Braga, moradora na Rua Nova de Santa Cruz, nº 19, herdou do pai o nome e as doenças. Há cerca de um ano o seu estado agravou-se, aparecendo-lhe perfeitamente declarado o mal de Pott – cifose lombar bem pronunciada, amolecimento da espinha dorsal, atrofiamento das pernas, uma das quais encurtou dois dedos, dores intensas em todo o dorso, gânglios escrofulosos no pescoço e falta de apetite.

Em Coimbra, onde pernoitou no regresso, a mãe verifica com surpresa e com uma alegria tão grande que lhe provoca as lágrimas, a cura do filho. No dia seguinte, essa cura provocou o assombro dos quatro médicos que trataram a feliz criança. A velha e pacata cidade dos Arcebispos impressiona-se e agita-se com a sensacional notícia, uma romagem de muitas centenas de pessoas inicia-se para casa da privilegiada família, a imprensa de grande circulação, tomando conta do caso, narra-o em colunas cerradas de prosa e cheias de pormenores interessantes e a ciência médica proclama unanimemente a certeza consoladora da cura extraordinária, inexplicável e porventura miraculosa.

A Procissão da Virgem do Rosário
A missa oficial
A bênção das doentes
O sermão do senhor Bispo de Beja
O regresso dos peregrinos.

A procissão da Virgem do Rosário realiza-se, na forma do costume, mas talvez com mais imponência e majestade. A entrada da Sagrada Imagem no Pavilhão dos doentes é uma das cenas mais empolgantes que é dado presenciar sobre a terra e tão grandiosa e tão bela que a pena sente a sua impotência para a descrever.

A explosão de piedade dos peregrinos, o acenar dos lenços por toda a vastidão imensa do recinto das aparições, desde o alto da estrada distrital até às colinas adjacentes, o reboar dos vivas e das aclamações entusiásticas, o estralejar das palmas, as súplicas, os soluços, as lágrimas dos doentes, enfim, a comoção vivíssima e irreprimível de tantas dezenas de milhar de crentes, tudo são facetas admiráveis desse quadro assombroso da procissão da Virgem, que faz vibrar intensamente as cordas mais íntimas da nossa alma, elevando-a para regiões que não são deste mundo.

Ao meio dia e meia hora, depois do canto do Credo, um sacerdote sobe ao altar central da capela das missas e começa o augusto sacrifício dos nossos altares, enquanto o capelão director dos servitas inicia a recitação em comum do terço do Rosário.

Terminada a missa, expõe-se o Santíssimo Sacramento e o Senhor Bispo de Leiria dá a bênção a cada um dos doentes. A comoção do ilustre Prelado é visível e traduz-se em lágrimas que lhe correm pelas faces.

Os doentes soluçam e todos choram ao ouvirem e ao repetirem as invocações dirigidas a Jesus oculto sob as espécies eucarísticas na custódia de ouro.

A bênção dos doentes é coroada com a bênção geral.

Depois, o senhor Bispo de Beja pronuncia um discurso breve, mas eloquente e incisivo, repassado de fervor religioso e de sentimento patriótico.

Começou por pedir três vezes a Nossa Senhora que mostrasse ser nossa Mãe: Monstra te esse matrem.

Mas seria preciso recordar com tamanha insistência a Nossa Senhora a sua prerrogativa materna, se Ela nunca esqueceu os seus deveres de Mãe, nunca afastou o seu rosto de nós, nunca consentiu que o seu coração deixasse de gotejar sangue pelos pecadores?... Não; mas a recordação é precisa, não para Ela, mas para nós, que somos fracos e pusilânimes e à semelhança das crianças, que só adormecem com o braço da mãe bem seguro, não vá ela fugir-lhes, também nós precisamos de estar assegurados do seu patrocínio, para que saibamos que ela está disposta a ser daqui para o futuro, mais solícita, mais terna e mais carinhosa, se isso é possível.

Talvez seja ousadia apelar para os sentimentos maternais de Nossa Senhora, neste lugar onde pulsa o coração do país inteiro e onde, há dez anos, milhares de portugueses se sentem mais próximos do Céu, mais crentes e mais patriotas. Vem ali pela primeira vez e não pode deixar de sentir uma estranha emoção ao ver aquele lugar, que quer geográfica quer espiritualmente é o coração de Portugal, e onde a vizinhança de Aljubarrota e da Batalha lhe trazem à memória as gloriosas recordações do nosso passado de heróis.

Houve um momento da nossa vida nacional em que tudo pareceu submergir-se: templos profanados, bispos e padres presos ou expulsos, a religião vilipendiada e esquecida. Mas Nossa Senhora não se esqueceu de que nós a havíamos um dia escolhido para Rainha e veio então a este lugar trazer-nos um argumento de fé, um argumento de piedade e de reparação nacional, mostrar-nos claramente que não é em vão que para Ela apelamos e nela pomos toda a nossa esperança.

Fátima é um lugar de festa, mas festa sem foguetes nem arraial, onde nós vimos retemperar a fé, para melhor procedermos na nossa vida pública e particular.

Fátima é um lugar de oração e de penitência, um lugar onde Nossa Senhora nos convida a meditarmos na maneira como temos cumprido os nossos deveres para com Deus e os seus representantes na terra, para com o próximo e connosco mesmos.

Façamos esta meditação e depois prometamos ser para o futuro mais observantes da sua lei.

Em seguida, peçamos-lhe por todos, pelo Sumo Pontífice, para que Deus o conserve e o livre de seus inimigos; pelas nossas famílias, para que ela as abençoe e as livre das ciladas que hoje em dia se armam às famílias cristãs; pela nossa Pátria, cercada de perigos tantos e tão grandes.

Aqui em Fátima, nunca deve esquecer-se esse lado patriótico desta romagem de piedade.

Peçamos pelos nossos doentes, de forma que eles consigam curar-se ou levem daqui a resignação para os seus males.

Não ouso pedir milagres, pois que maior milagre se podia exigir do que o de ver esta multidão, vinda de todos os pontos do país, arrostar com todas as dificuldades, com a chuva, com o mau estado das estradas, com tantas contrariedades para virem até ali prestar o culto da sua homenagem a Nossa Senhora?!

Para todos, Senhora, sede propícia e misericordiosa. Mostrai que sois nossa Mãe!

Quando os megafones produziam as últimas palavras do venerando Prelado, uma chuva torrencial começava a cair para não cessar senão às primeiras horas da noite.

E era sob as cataratas do céu abertas de par em par que os peregrinos subiam até à estrada adjacente a fim de se recolherem nos veículos que os aguardavam e que os haviam de conduzir aos seus lares distantes, com as almas docemente esmagadas por tantas e tão fundas emoções e cheias de saudades daqueles dois dias inolvidáveis passados na terra sagrada de Fátima, a futura cidade da Virgem.

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