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Um conto de duas cidades
Nos primeiros séculos da Igreja surgiu uma tensão semelhante, resultante das abordagens interpretativas divergentes das escolas catequéticas de Antioquia na Síria e de Alexandria no Egito. Antioquia era conhecida por sua ênfase no sentido literal das Escrituras, enquanto Alexandria preferia os sentidos espirituais. O melhor de Antioquia reflecte-se nos profundos e eloquentes sermões exegéticos de São João Crisóstomo. Na melhor das hipóteses, o método antioqueno permitiu que exegetas e pregadores recriassem as cenas bíblicas com notável precisão e vivacidade. Enquanto isso, em Alexandria predominava a interpretação mística do Evangelho de João, auxiliada pelo método alegórico de Fílon, um filósofo judeu daquela cidade do século I. A profundidade e o poder de Alexandria são evidentes, por exemplo, na cristologia de Santo Atanásio, o grande defensor da Trindade e da Encarnação.
Ambas as escolas, é claro, tinham pontos fracos. Ambas as escolas produziram hereges. Os antioquenos mais extremistas tendiam ao racionalismo, como podemos ver no infame exemplo de Ário, o arqui-herege da Igreja antiga. Os excessos de Alexandria, por outro lado, tenderam para a heresia gnóstica, espiritualizando excessivamente os textos bíblicos, chegando até à negação do seu significado histórico-literal.
No período patrístico posterior, Padres da Igreja como Jerônimo e Agostinho encontraram um equilíbrio entre as duas abordagens, escolhendo uma ou outra para atender às necessidades do momento. Este equilíbrio ajudou a estabilizar a exegese no período medieval; enquanto os sentidos espirituais predominavam nos mosteiros (por exemplo, São Bernardo de Claraval), o literal recebeu atenção considerável nas universidades (por exemplo, São Tomás de Aquino na Universidade de Paris).
Tal exegese e vitalidade teológica coincidem ao longo da história da Igreja. O Cardeal Newman observa na conclusão do seu estudo sobre o desenvolvimento doutrinário: “Pode ser quase estabelecido como um facto histórico que a interpretação mística e a ortodoxia permanecerão ou cairão juntas.” 6
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