Privação sensorial

No entanto, com a Reforma Protestante, a exegese espiritual gradualmente caiu em desuso, dependente como estava de uma comunidade estável de exegetas, que partilhavam uma fé comum. Na verdade, o teólogo protestante suíço Emil Brunner identifica o desenrolar da exegese espiritual como a própria substância da Reforma: “Argumentar que é correto usar a tipologia como exposição porque ela foi usada pelos Apóstolos é um argumento que . . . só pode ser descrito pela palavra 'terrível'. Só podemos alertar as pessoas com maior urgência contra esta confusão de pensamento, que inevitavelmente nos leva de volta a uma posição religiosa que os Reformadores tinham superado; na verdade, esta vitória constituiu a Reforma.” 7

Entretanto, na esteira do Iluminismo secularista, a exegese histórica rapidamente degenerou em mera “crítica histórica”, o que transformou uma atitude de suspeita contra o próprio texto. Com o tempo, a verdade de quase todas as linhas das Escrituras seria questionada à medida que os críticos históricos ganhassem ascendência nas universidades e seminários. Dentro da Igreja, o abuso de métodos críticos provocou a “crise modernista” na virada do século XX, resultando na excomunhão de vários exegetas.

Mas será que estes métodos corrosivos continuam a prevalecer hoje? Permitam-me citar um relatório de 1985 do Cardeal William Baum, então prefeito da Congregação para a Educação Católica do Vaticano: “Há uma ruptura entre a Bíblia e a Igreja, entre a Escritura e a Tradição. . . . Em nome da ciência, muitos exegetas já não desejam interpretar as Escrituras à luz da fé, e o resultado final é que a dúvida é lançada sobre verdades essenciais da fé, como a divindade de Cristo e a sua concepção virginal no ventre de Maria, o valor salvífico e redentor da morte de Cristo, a realidade da sua ressurreição e da sua instituição na Igreja. Os resultados desta chamada exegese científica estão a ser difundidos nos seminários, nas faculdades [teológicas] e nas universidades, e mesmo entre os fiéis, também através da catequese e às vezes até da pregação. A Dei Verbum recomendou a exegese científica, mas dentro dos limites da fé, pois o método histórico-científico por si só não é suficiente neste campo”. 8

Mesmo nos nossos dias, o sentido espiritual permanece decididamente fora de moda.