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12:28 εἰ ἐν Πνεύματι Θεοῦ ἐγὼ ἐϰβάλλω τὰ δαιμόνια
ἄϱα ἔϕθασεν ἐϕ᾽ ὑμᾶς ἡ βασιλεία τοῦ Θεοῦ
se eu expulso demônios pelo Espírito de Deus,
então o reino de Deus chegou sobre você
ESTE PRONUNCIAMENTO PROFÉTICO de Jesus resume na mais breve fórmula o evento essencial que constitui a salvação. Salvar para Jesus significa expulsar do ser humano o poder dominante que mantém o homem escravizado a uma multidão de forças destrutivas. Todas essas forças, independentemente da área particular do ser humano que controlam, têm em comum um efeito alienante catastrófico, isto é, mantêm o homem longe de Deus e da sua natureza mais autêntica. Mas “Cristo participou da natureza humana para que, pela morte, pudesse destruir aquele que tem o poder da morte, isto é, o diabo, e libertar todos aqueles que, pelo medo da morte, estavam sujeitos à escravidão para toda a vida” (Hb 2:14). E “o Pai nos libertou do domínio das trevas e nos transportou para o reino do seu Filho amado” (Cl 1:13). Seria necessário ouvir o Evangelho entoado no tom retumbante e estrondoso de um diácono grego, russo ou maronita, clamando visceralmente as boas novas da redenção, para experimentar a plena expressão litúrgica do poder de libertação da Palavra.
Quem, a julgar apenas pela aparência exterior do Nazareno percorrendo as estradas da Galiléia, conversando com um grupo aqui, curando um doente ali, sempre dando consolo, teria adivinhado que este tremendo drama, esta batalha cósmica, esta destruição da morte e libertação da escravidão e transferência para fora das trevas estava de fato acontecendo? Aqui, neste acontecimento transcendental que muda o próprio fundamento ontológico do mundo, reside o coração do cristianismo e o sentido profundo da morte e ressurreição de Cristo. Cristo não veio meramente para ensinar uma nova doutrina sobre como deveríamos nos comportar ou para dar um exemplo de altruísmo. Cristo veio acima de tudo para realizar uma ação: a destruição da morte e o estabelecimento de um Reino eterno de Vida, e esta ação o constitui como o Primogênito de uma nova criação (Cl 1:15). “Se alguém está em Cristo, é nova criatura” (2Co 5:17). Só a prodigiosa revolução operada por Cristo no próprio âmago do ser pode explicar a densidade adquirida nesta frase pelo verbo “ser” e pela preposição “em”.
O primeiro passo na realização deste feito é a expulsão dos espíritos do mal das pessoas e do habitat de todos os que nascerão depois dele nesta nova criação. Numa rara ocasião, o próprio Jesus levantou o véu do comum e expôs “as profundezas de Satanás” (Ap 2:24) e a batalha necessária que espreita logo abaixo da superfície. Os setenta discípulos estavam exorcizando espíritos malignos, e quando “voltaram com alegria, dizendo: 'Senhor, até os demônios se sujeitam a nós em teu nome!', ele lhes disse: 'Eu vi Satanás cair do céu como um raio. '” (Lc 10,17-18). Quão grande é o contraste aqui entre o feito humano visível e o importante evento cósmico! E, no entanto, esta última é uma consequência direta da primeira, tal como o poder dos sacramentos, que funcionam com meios exteriores tão comuns e produzem resultados tão profundos no domínio da graça.
Outro exemplo de redenção como triunfo sobre as forças demoníacas é aquele momento de iluminação quando Paulo é deslumbrado pela graça a caminho de Damasco. Jesus lhe diz: “Eu te envio [aos gentios] para abrir-lhes os olhos, para que se convertam das trevas para a luz e do poder de Satanás para Deus, para que recebam o perdão dos pecados e um lugar entre aqueles que são santificado pela fé em mim” (Atos 26:17-18). E o mesmo Paulo escreve mais tarde aos Romanos que “o Deus da paz esmagará em breve Satanás debaixo dos vossos pés” (Rm 16:20). Quão apropriado aqui é que um feito poderoso que esmaga o Demônio seja realizado através de nós por um Deus de paz! Tal perspectiva deveria modificar radicalmente a nossa noção convencional de que a paz equivale à passividade.
O mais digno de nota em todos estes casos é não apenas a batalha contínua com Satanás como a própria condição da existência cristã, mas também a forma como os discípulos de Cristo são eles próprios combatentes indispensáveis e através dos quais o poder de Deus triunfa. Na derrota de Satanás por parte de Jesus e dos seus discípulos vemos, de facto, o início do cumprimento da ameaça de Deus à serpente no Jardim do Éden: “Porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e sua semente; ele esmagará a sua cabeça enquanto você lhe ferirá o calcanhar” (Gn 3:15). Se o exorcismo do endemoninhado por Jesus é o sinal seguro de que o Reino de Deus chegou ao nosso meio, fica claro nestes textos que a extensão desse Reino depende muito da guerra que os discípulos de Jesus estão dispostos a empreender. Discipular, neste contexto, significa participar na obra de exorcismo de Jesus, uma vez que não há nada que Jesus faça no Evangelho que os seus discípulos não sejam chamados a fazer por sua vez, nele e através do seu poder. E assim Paulo conclui a sua Carta aos Efésios com uma exortação vibrante que de facto concebe o cristão como um guerreiro contra o reino satânico:
Fortalecei-vos no Senhor e na força do seu poder. Vista toda a armadura de Deus, para que você possa resistir às ciladas do diabo. Porque não lutamos contra a carne e o sangue, mas contra os principados, contra as potestades, contra os governantes mundiais das presentes trevas, contra as hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais. (Ef 6:10-12)
O texto prossegue então definindo precisamente a natureza das “armas” estratégicas cristãs com as quais devemos estar equipados para derrotar o poder de Satanás: o cinto da verdade, a couraça da justiça, os sapatos da paz, o escudo da a fé, o capacete da salvação, “e a espada do Espírito, que é a palavra de Deus”, tudo isso concretizado pela oração, pela vigilância, pela perseverança e pela comunhão com todos os santos (Ef 6, 13-18). Este retrato realista da luta cristã feito por Paulo pode ser paradoxal pelo seu “arsenal do espírito” altamente original; e ainda assim ele não pode enfatizar mais enfaticamente o ponto de que, para os eleitos de Deus, certamente haverá uma grande batalha.
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